quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Ella Fitzgerald estava la me esperando.
Deixei o primeiro jato de agua quente cair sobre meu corpo e
suspirei... na sequencia acompanhei Ella na cançao.
Muitos óleos e hidratantes depois, descansada e com o corpo bem aquecido, era o momento adequado para o chá de maça com cravo e framboesa.
Meu cabelo estava molhado, eu usava moleton. Os respingos do cabelo no meu ombro, do lado de dentro, e os respingos de chuva, do lado de fora do vidro. Chove-se muito por aqui. E muita chuva é brega. Qualquer respingo do lado de fora, ja é motivo para encostar a testa, fazer cara de paisagem e embaçar o vidro com a minha respiraçao.
Nesses momentos minha imaginaçao vira uma colcha de retalhos, e vai do luxo ao lixo.
Afinal, é nessa pausa que se tem tempo para pensar nas coisas mais essenciais e nas mais irrelevantes...
Dá pra relembrar a letra daquela musica do Rei Roberto que a minha vó entrava em estado alfa, dá pra contar quantas pontas duplas tem na minha mecha oeste, dá pra cantar " Meu chapeu tem 3 pontas " varias vezes, dá pra fazer uma lista de coisas que preciso comprar na loja de 1,99 ( sim, em Paris tb existem lojas de 1,99 ), dá pra estudar que cor de esmalte combina mais nas minhas unhas do pé...nossa...uma infinidade de futilidades!!!
As essenciais eu nao comento, ninguem teria paciencia pra ler, alem das irrelevantes serem bem mais divertidas.
No dia seguinte, a mesma coisa...o mesmo moleton, o cabelo molhado, encosto a testa na janela...e o moleton so nao vira meu uniforme oficial para todas as horas, pq é justamente nessa pausa ( na qual minha mente fica enriquecida ), que eu me dou conta de que todos os moletons do maravilhoso universo do meu armario, estao furados bem ali...
Ainda bem...um bom jeans ou as saias de viscolycra me favorecem mais.
Escurece. Eu acendo as luzes, e ja ja o Ernesto e a Janette estao passando aqui para um passeio.
É sempre uma alegria quando Ernesto aparece...ele traz flores e a famosa coalhada que a mae dele faz.
Muito dificil Ernesto aparecer....ele trabalha muito e tem uma vida corrida, dividida entre trabalho, estudos e familia....mas sempre tem tempo pra mim. Janette já é mais presente..nos vemos de 4˚ a domingo no Châtelet.
Dessa vez iremos ao Louvre. Depois de rever a Mona Lisa e a Venus de Milo pela 18˚ vez, corremos de maos dadas no patio da piramide. Ela fica mais bonita a noite, quando as luzes estao acesas.
Ao terminar a sessao 100 metros rasos no seu quadrado....ou melhor, no patio do Louvre, ainda há tempo pra pegar um cineminha....Os passeios com Ernesto sao sempre muito culturais e economicos ( ele sempre faz a gentileza de pagar meus tickets ).
O filme acaba tarde, e eu nao aguento ir a nenhum lugar que tenha cheiro de café e que esteja tocando Charles Aznavour ao fundo. Prefiro que Janette e Ernesto venham comigo pra casa para experimentarmos a coalhada com mel e para ouvir as piadas que ele tem pra contar...cada semana ele vem com umas 6 ou 7 inéditas, nao sei da onde ele tira....será que o Ari Toledo tambem lançou livros por aqui?
Duas cumbucas de coalhada depois, Ernesto vai pra casa dele, Janette desce pro seu ap e eu vou pra minha cama ( de moleton, ca-laro ).
Acordo com dor nas costas, o cabelo umido, uma rodela vermelha na testa, o vidro completamente embaçado, o cheiro do restinho do chá de maça que sobrou na caneca, com aquela musica antiga do Rei na cabeça e vestida no moleton.
Adormeci na janela.
Acordei atrasada pro trabalho...se nao saio cedo, pego o transito das 7 na Paulista.
Ninguem merece.